Compaixão, Política e Pandemia: Como Espiritualistas Se Posicionam Diante das Injustiças?
Há anos venho vivendo uma crise interna: de um lado, sou combativa, indignada, militante, sedenta por transformação, inconformada com injustiças.
Do outro, sou compassiva, espiritualizada, “good vibes” e sei que a e Empatia, a Compaixão e o Amor podem salvar a todos.
- Como lutar por mudanças, sendo compassiva?
- Como ser agente de transformação, mantendo a alta vibração?
- Como ser informada e, portanto, às vezes tomada pela raiva, mas ainda ser coerente com a minha espiritualidade?
- Como ACEITAR o presente e mesmo assim, agir pra transformar o futuro?
Essas são perguntas que sempre rondaram minha cabeça e me fizeram migrar de um extremo ao outro, muitas vezes. São perguntas que sempre fiz aos “gurus” que encontrei e essas foram as perguntas que me guiaram também na busca dos meus mestres espirituais.
Vou aqui fazer uma “brincadeira” com a palavra, para tentar trazer clareza ao meu pensamento:
“COMPAIXÃO” começa em COM, que aqui em minha brincadeira, traz o significado de “JUNTO”: Dois lados de uma mesma moeda para sermos inteiros. Aqui começa a minha integração, para entender que a COMPAIXÃO não precisa (e ao meu ver, não deve) ser PASSIVIDADE. Ser Compassivo não significa ser Passivo.
A Segunda parte da palavra COMPAIXÃO é PAI. E aqui lembro de um grande mestre da humanidade, ao qual muitos chamam de PAI: Jesus Cristo.
Jesus Cristo, quando encontrou os Mercadores vendendo pombas para sacrifício e trocando dinheiro no Templo de Herodes, em Jerusalém, não foi com eles compassivo. Ao invés disso, percebendo o quanto aquela atividade era errada, resolveu AGIR. Fazendo um chicote com algumas cordas, «…expulsou a todos do templo, as ovelhas bem como os bois, derramou pelo chão o dinheiro dos cambistas, virou as mesas e disse aos que vendiam as pombas: Tirai daqui estas coisas; não façais da casa de meu Pai uma casa de negócio.» (Mateus 21:12-13)
Essa é apenas uma passagem que mostra uma face pouco comentada de Jesus, mas que foi sempre presente: a face da luta. Jesus era um subversivo. Carpinteiro e pobre, se uniu a outros trabalhadores com a missão de libertar outros pobres. Por onde andou, encontrou resistência e conspirações das classes dominantes. “O mundo não pode odiá-los, mas a mim odeia porque dou testemunho de que o que ele faz é mau.” (João 7:7).
Terminou perseguido, preso, torturado e morto por buscar justiça social. Caminhou com amor pelo povo, mas sem medo, ou piedade de enfrentar quem precisasse enfrentar, como os mercadores, os fariseus. Não se calou, não esperou que o Pai resolvesse tudo. Ele, como filho, arregaçou as mangas, fez e falou o que era necessário.
Podemos falar também de Gandhi, que empregou a resistência não violenta para liderar uma campanha POLÍTICA: a independência da Índia do Reino Unido. Ele não aceitou calado ou se alienou da realidade. Ele não ficou só rezando ou meditando. Ele entendeu a realidade, falou sobre ela, brigou por ela, foi preso por ela. A compaixão de Gandhi foi empregada à serviço dos indianos que pagavam um imposto insano aos ingleses. Juntou muitos na Marcha do Sal, exigiu que os ingleses abandonassem a Índia. Não teve compaixão pelos ingleses, foi compassivo com o seu povo, que era a parte oprimida, que precisava de seu apoio.
Chegamos à terceira parte da palavra COMPAIXÃO e tomo a liberdade de interpretá-la foneticamente: chão.
Compaixão, com pés no chão. Ser compassivo não é ser alienado. Assim como Jesus e Ghandi abraçaram grandes causas, se posicionaram firmemente e enfrentaram as dificuldades mundanas para combater as injustiças, talvez também seja nosso dever espiritual nos envolver, posicionar e SIM, lutar contra as injustiças.
Muitos líderes espirituais da atualidade também abraçam causas sociais, denunciam os opressores e buscam um caminho de libertação das injustiças. Monja Coen sempre esteve envolvida com as causas do povo, participa ativamente de debates políticos, sempre se posiciona nos assuntos importantes à sociedade. Prem Baba ensina sobre a Nova Era, trazendo sempre muita luz para as questões de injustiça, falando da importância de criarmos um movimento que vai despertar uma nova realidade social, que envolve uma nova educação, o combate à desigualdade e um novo sistema, não baseado no consumo desenfreado, mas na preservação do meio ambiente. Thich Nhat Hanh, um dos mestres mais conhecidos do Zen-Budismo, é ativista da paz e dos direitos humanos, fundador do movimento “Budismo Engajado”, que apesar de apoiar seu trabalho nos conceitos de “não violência” e “ação compassiva”, princípios básicos do budismo, persuadiu Martin Luther King a se opor PUBLICAMENTE à Guerra do Vietnã.
Em uma relação feita pelo mestre zen sobre os 14 preceitos para o budismo engajado, ele diz: “Não evite o sofrimento, não feche seus olhos ao sofrimento. Não perca a consciência da existência do sofrimento na vida do mundo. Encontre maneiras de estar com aqueles que estão sofrendo, incluindo contacto pessoal, visitas, imagens e sons. Por tais meios, lembre a si mesmo e aos outros à realidade do sofrimento no mundo.”. Ele também diz: “Tenha a coragem de levantar sua voz quando vir uma situação injusta, mesmo quando ao fazer isto você coloca sua segurança em perigo.”
A minha conclusão é que a verdadeira compaixão precisa ser praticada em consciência plena, a serviço dos oprimidos e contra as injustiças. Me sinto cada dia mais confortável em unir minha luta à espiritualidade, com a consciência de que pratico a compaixão ao povo e não preciso, nem devo ser compassiva com o fascismo e com quem o representa.
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